Sofia Ribeiro Fernandes, crónicas de uma Mãe Pediatra e de uma Pediatra Mãe



Sofia Ribeiro Fernandes, crónicas de uma Mãe Pediatra e de uma Pediatra Mãe


sábado, 29 de julho de 2017

Fausto

Fixei-me nos sapatos, pretos, de pele entrelaçada e possivelmente com perfume a tinta fresca de sapatos. Deitado em frente a mim, imóvel e só me fixei nos sapatos. Devia olhar o rosto, as mãos, a gravata, mas só me fixei nos sapatos. O rosto emagrecido, as mãos débeis, não pareciam as suas. Mas, os sapatos estavam tal e qual: iguais. Sempre impecavelmente limpos e arranjados, um verdadeiro luxo que não abdicava. 
Fica a imagem dos sapatos alinhados a somar-se às muitas outras que me deixas ficar. O pão fresco que, com chuva ou sol, ias buscar para mim. As compras de adolescente que nos faziam ir às lojas mais cool da cidade. A colher tingida de negro brilhante que acompanhava o almoço de todos os dias e que tinha sido a companheira na Índia, a única companheira de meses a fio. As histórias que contavas em qualquer lado e a qualquer hora, penetrantes. A liberdade em aceitar as mudanças, que a idade não daria. A firmeza nas decisões. Os amigos da rua e do café. E, fica tanto mais...
Ao homem mais íntegro e maravilhoso que alguma vez conheci.





terça-feira, 11 de julho de 2017

Nem doutor, nem Engenheiro

Os médicos deveriam ter, na formação, uma cadeira de boas maneiras, de gentileza, colocação da voz, e de bom senso. De regresso ao sítio onde os meninos ficam mais doentes e por mais tempo, ou porque se esqueceram de contar o tempo para nascer, ou porque desregularam os botões da máquina, apercebo-me assim, em modo espectadora, que fazem parte as palavras. 
As palavras contam. Contam quando são em modo off/surdina. Contam quando vêm embrulhadas em mãos que se tocam. Contam quando são transparentes. Contam quando não são fugidias. Contam quando não nos fazem morrer por dentro por mais cruas que sejam. 
Ilude-se quem pensa que que é fácil dar más notícias. Não é. E, há muito quem não saiba fazê-lo, e o faça da pior maneira. 
A exemplo: dizer para uma terceira pessoa, "já sabes que nunca há-de ser doutor ou engenheiro", mesmo à tua frente, para que ouças esse pensamento acompanhado de um acenar de cabeça afirmativo que o reforça. Esta constatação reforçada pelo aceno, é uma forma parva de tentar perceber se estás ciente do futuro, um baixar expectativas e abanar o coração. 
Cara colega, a constatação do futuro premeditado não dita condutas, nem modifica sorrisos. Ouvir desta forma é rude e dói, não pelo futuro mais ou menos brilhante, mas pelo que traz consigo nas entrelinhas. (Que se lixe o Dr. ou o Eng...) Cara colega, seria uma nota zero redonda na cadeira proposta para integrar os novos cursos de Medicina.
(Episódio pessoal datado de alguns anos atrás. Agora, deixei de ouvir constatações estupidifico-científicas- esta palavra não existe, mas achei-a tão perfeita...) 


Eu & Josefinas em Vidago Palace Hotel a colorir o chão pintado de igual e simércio